Sócia da primeira hamburgueria vegana de São Paulo, Rosane conta como foi a trajetória do espaço localizado na Vila Mariana e a relação com o veganismo para além dos lanches

Em uma época onde os hambúrgueres que imitam a carne têm surgido a todo instante, o Salad Days, com seus hambúrgueres artesanais feitos com os mais diversos tipos de ingredientes vegetais, segue se tornando um clássico de São Paulo. E a Animal Equality conversou com Rosane Calegari, co-fundadora e sócia do espaço, que, além de ser o primeiro especializado em hambúrgueres com cardápio totalmente livre de produtos de origem animal na cidade, é uma referência quando se trata de comida boa, acessível e politicamente engajada. Confira a entrevista:

De onde surgiu a ideia de abrir uma hamburgueria?
A intenção de ser uma hamburgueria foi por conta de não ter nenhuma hamburgueria vegan na cidade ainda naquela época [2016]. Víamos lanches bons em algum lugar e doces em outros, mas nunca íamos em um só e estávamos satisfeitos. Queríamos proporcionar essa opção pra todos, e principalmente fosse com um preço justo. 

Você já cozinhava?
Eu e o Wellington, meu sócio e amigo, cozinhamos desde criança, mas quando nos tornamos veganos tivemos ainda mais vontade de cozinhar, não só pela falta de produtos sem ingredientes de origem animal na cidade em que morávamos [ela em Timbó, Santa Catarina e ele em Carapicuíba, na grande São Paulo], mas também porque aprendemos desde o começo do veganismo que ele tem que vir com autonomia. Você tem que saber o que está comendo, aprender a fazer sua própria comida e dar valor a isso.

Como foi o começo do Salad Days? Foi intencional abrir uma vez por semana no início?
Wellington e eu trabalhamos com comida vegan juntos desde 2012, fazendo salgados, bolos e lanches em eventos. Em Janeiro de 2016 eu trabalhava no atendimento do Gopala Madhava Delivery [restaurante indiano lactovegetariano na região da Rua Augusta, no centro de São Paulo] e ele numa empresa de bike entrega que prestava serviço pro restaurante. Ficamos próximos da dona, a Madhava, e ela deu a ideia de abrirmos aos sábados algo vegano lá. Ela nos deu essa oportunidade e fomos atrás de fazer o nosso melhor. Chamamos nossos amigos para nos ajudar, com o logo, as artes e para trabalhar com a gente. Sempre vamos ter um carinho enorme pra quem nos ajudou principalmente nesse começo. 

Como foi a recepção do público?
Antes mesmo de inaugurar, fizemos um instagram que em menos de uma semana já tínhamos mil seguidores. Vários sites vieram falar com a gente e divulgaram. Era algo muito esperado por todos. Tanto que no primeiro dia, foi um caos. Eram muitas muitas muitas pessoas, dentro do local, na calçada, na rua, na calçada no outro lado da rua. No começo foi difícil nos organizarmos para atender essa demanda de público, mas com alguns sábados conseguimos.

Porque Salad Days?
Salad Days é o nome de um EP e uma música da banda Minor Threat. Viemos do movimento punk, essa banda é uma das grandes inspirações pra nós. Tanto no som, mas principalmente nos ideais como o veganismo e o straight edge. O nome Salad Days veio logo na nossa mente quando começamos a pensar sobre. 

Como é o processo de criação dos pratos?
A gente sempre pesquisou muito os restaurantes de fora do país, vendo fotos e vídeos. No começo foram nossas maiores inspirações, por mais que a gente nunca tenha a oportunidade de viajar de fato pra fora, conhecer esses lugares e provar essas comidas. Mas conforme foi passando o tempo, a gente só passou a pensar em lanches e sabores que nós mesmos gostaríamos de provar. O Wellington é super criativo, a maioria dos lanches foi ele que criou. 

Quais os planos para o futuro do Salad Days?
Depois de mudarmos de lugar, do Gopala abrindo apenas aos sábados, fomos para o nosso espaço na Ana Rosa, abrindo quinta, sexta e sábado e acabamos mantendo esse horário. Ano passado começamos a fazer “churrasco” vegan em alguns domingos e todos foram sucesso. Agora estamos estudando muito sobre quais passos vamos seguir. Vamos continuar nesse mesmo lugar mesmo sendo pequeno, mas abrir em mais dias, aceitar mais formas de pagamento, fazer eventos como esse “churrasco” mais regularmente. Queremos aproveitar mais o espaço e mostrar tudo que sabemos fazer. 

Você é vegan há quanto tempo? Como conheceu o movimento?
Eu sou vegan desde 2008, minha irmã já tinha virado vegan. Comecei a frequentar shows de punk hardcore em Blumenau e conheci pessoas que já eram adeptas, depois fui conhecendo cenas de outras cidades e estados. Fui aprendendo muito sobre política, tendo vivências, lendo bastante. O veganismo era algo muito falado nesse meio, logo vi o quanto era possível e necessário. Wellington é vegan desde 2005 e conheceu o movimento na Verdurada, comendo rango vegan e aprendendo muito pelas palestras e bandas que tocavam. 

Quais dicas daria para quem está começando a se interessar pelo veganismo?
Leia muito! Aprenda a cozinhar, vá na feira de rua perto de sua casa. Tente saber de onde vem o seu alimento. Dê valor a pequenos produtores e pequenas empresas. Vá em restaurantes vegan que te tratem bem, mas também que não exploram e nem maltratem nenhum funcionário. 

Acha que temos falado mais sobre veganismo hoje em dia? Quais ainda são os principais desafios do movimento?
Com certeza, veganismo ficou muito mais conhecido nos últimos anos, e esse conhecimento da população em geral tem os prós e contras. Hoje é muito mais fácil encontrar produtos vegan no mercado, em restaurantes, produtos de higiene e limpeza, acessórios vegan também. Mas ao mesmo tempo o ideal se perdeu nessa caminhada pra muitas pessoas que a usam como dieta e não como um ato político. Veganismo é política. Veganismo é você não usar nada de origem animal, ser contra a exploração animal, humana e não-humana. Hoje em dia você vê alguém vegan de direita e isso não faz sentido.

Entender que não pode comer outro animal tem que te fazer pensar em todas as suas atitudes com todos ao seu redor. Isso faz o feminismo, a luta de classes, luta de negros, índios, homossexuais e trans, entre outras, fazer todo sentido. O veganismo precisa de autonomia, precisa de política. 

Quais outros lugares para os seguidores da Love Veg conhecerem?
Urbã (e Pizza Youth), Toya, Broto Primavera, Subte Vegan, Vaca Ateliê Culinário, Mount Zion, That Vegan Brand.


Salad Days
Rua Machado de Assis, 284 – Vila Mariana
Telefone: (11) 2533-7806
Horário de funcionamento: quinta-feira a sábado das 17h às 22h
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Guilherme Petro

Jornalista, cozinheiro e professor de culinária, é co-autor do Prato Firmeza – Guia Gastronômico das Quebradas e cria conteúdos sobre alimentação consciente e acessível. Acompanhe mais no Instagram @guilhermespetro.