Moradora da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, Caroline é integrante do Movimento Afro Vegano e usa seu perfil no Instagram (@afro.sou) para compartilhar receitas e informações que promovam uma alimentação à base de plantas mais acessível. No último ano, ela criou a campanha #comamaisfrutas, que se espalhou pela rede. Confira a conversa que a Love Veg teve com ela:

Desde quando tem o perfil no Instagram? Por que decidiu criá-lo?
Desde o final de 2017. Decidi criá-lo para que amigos e familiares pudessem ver que era muito fácil preparar uma refeição vegana. Era o jeito mais rápido de responder a famosa pergunta: “Agora que você é vegana, o que você vai comer então?”. Resolvi fotografar para que todos pudessem ver e testar algumas das receitas.

Esperava essa quantidade de seguidores e seguidoras? Como foi no começo? Sente que esse número tem crescido?
Não esperava, isso aconteceu naturalmente. Como disse, apenas queria mostrar o que eu comia a partir das fotos, e quem sabe inspirar outras pessoas próximas a mim. Esse número tem crescido porque as pessoas têm se preocupado mais com que o comem, com a saúde, e estão muito mais abertas a reconhecer o veganismo como um modo de vida.

Quando decidiu se tornar vegana? Como foi esse processo?
Eu falo pra todo mundo que isso foi uma construção. Sou formada em Turismo pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e sempre fiz pesquisas sobre unidades de conservação.  Desde então, repensava a minha relação com a natureza e durante todo esse tempo me questionei se a minha posição não era contraditória, porque apesar de querer defender, abraçar e salvar o meio ambiente, ainda comia carne.

Com o tempo, fiz alguns cursos extras durante a graduação. Aproveitei que estava desempregada e tive o privilégio de fazer um curso de educação ambiental, longe de casa, no centro do Rio. Assistindo a uma dessas aulas, tive um professor que discorreu sobre a situação ambiental no país, da indústria da carne e, de repente, começou a falar sobre o veganismo. Naquele dia eu parei de comer carne.  Logo, os conflitos começaram, e me vi pesquisando sobre outros tipos de alimentação.

Eu moro numa área periférica do Rio de Janeiro, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense. Cheguei em casa e falei com a minha família, que não me deu muito crédito, mas me apoiou. E assim começou a minha jornada.

Primeiro virei ovolacto-vegetariana, e essa era a minha zona de conforto no início porque eu não tinha maiores informações e não sabia por onde começar. Procurando no Facebook, achei um grupo de vegetarianos e veganos na Baixada Fluminense. Uma pessoa criou um evento de piquenique na Praça do Skate, em Nova Iguaçu, para levar pratos veganos e um suco. Foram 4 pessoas e foi lindo ter encontrado outro vegs com quem eu pudesse tirar minhas dúvidas. Desde então, resolvemos continuar esses encontros e o número de participantes aumentou. Por conta de trabalhos e outros afazeres, a galera que estava comigo na organização se afastou, e foi assim que me vi coordenando estes piqueniques.

Após o terceiro encontro, depois de muitas conversas com outras pessoas dentro desse grupo, tomei a decisão de parar de consumir laticínios e ovos. E, desde então, nasceu uma nova Carol.

Teve alguma dificuldade na transição? Qual foi a maior e como fez para passar por ela?
A maior dificuldade que eu tive foi largar o queijo. Só consegui parar quando conversei com veganos que me mostraram como o processo da produção do leite era cruel e doloroso. A separação da vaca e do seu bezerro. E todo o tempo que elas precisam ser ordenhadas, até que o ciclo da inseminação se repete. Vi alguns documentários que também me deixaram com repulsa, e foi assim que eu parei. Acredito que a parte mais difícil ainda seja a compra de produtos sem origem animal. Pela questão do valor alto, principalmente, de sapatos, cosméticos, entre outras outras coisas, ainda mais onde eu moro.

Como surgiu a ideia da hashtag #comamaisfrutas?
O #comamaisfrutas foi um puxão de orelha em mim mesma. Durante um tempo eu estava me alimentando muito mal durante a manhã. Precisava acordar muito cedo, e me entupia de café com toneladas de açúcar. Com isso, desenvolvi insônia e ansiedade também. Decidi que precisava comer melhor, e então resolvi cuidar mais de mim, e comer apenas frutas no café da manhã. Acabei motivando outras pessoas, e isso tem sido incrível, de verdade! No inbox, sempre surge alguém pra falar que retomaram a comer frutas depois que eu comecei a postar a foto com a hashtag.

Você sempre cozinhou? Quais referências usa na criação das receitas?
Cozinho desde pequena. Aprendi tudo com a minha mãe e com a minha vó. Sempre as via preparando em casa e também na organização de todas as reuniões de família. Hoje, adapto todas as minhas memórias e afetividades sem a necessidade de qualquer crueldade animal. E o melhor, com o elogio delas <3.

O que é o Movimento Afro Vegano e como ele atua?
O Movimento Afro Vegano é a luta antirracista de pessoas pretas e veganas. O MAV considera o recorte social e racial na luta do veganismo. A gente é do corre. Da comunidade, da periferia, e precisávamos reunir a galera que se entende pela vivência. Aliás, o grupo surgiu após um ato racista com um irmão, dentro de uma loja vegana em SP. Foi o lugar em que eu me senti acolhida e em que pude finalmente dizer: “cara, em gente igual a mim aqui!”, que além de lutar pela vida dos animais, luta pela sua sobrevivência, visto que um jovem negro no Brasil é morto a cada 23 minutos.

Sente que, de maneira geral, as pessoas têm se interessado mais pelo veganismo? Como enxerga esse cenário e o que espera para o futuro?
Eu entendo que as pessoas estão mais preocupadas com a sua saúde, para falar a verdade. Ainda falta sensibilização por parte da sociedade em relação a morte de animais. As pessoas entendem que não podem ser responsáveis pela morte indiretamente dos animais, já que ninguém é capaz de fazer isso com as próprias mãos. Estamos conversando mais sobre os direitos dos animais, e espero um cenário positivo a partir da articulação do movimento vegano para a construção de um mundo mais justo a partir da libertação animal humana e não-humana.

Quais dicas daria para quem está começando a conhecer o veganismo?
Primeiro, pense nos animais. Não se prenda a produtos industrializados. O veganismo pode ser acessível e ainda bem que tem sacolão em todo bairro.  Existem ótimos grupos nas redes sociais em que você pode fazer amizades veganas e, para além disso, aprender novas receitas também.

Veganismo é o possível e praticável.

O que indicaria para as seguidoras e seguidores da Animal Equality no que se trata de bibliografia sobre veganismo e alimentação, pessoas para seguir e lugares para consumir?
Bom, posso indicar um blog sobre negritude, periferia e veganismo, da Thallita Xavier: meucorponegro.blogspot.com e o Veganagente – Direitos Animais, veganismo, veganismo interseccional, libertação animal e libertação humana, oposição ao especismo e ao antiveganismo: veganagente.com.br.

Atualmente, tenho lido uns documentos que acho na internet por aí: Nutricide – Llaila Afrika; Alkaline Herbal Medicine do Aqiyl Anis e também Dr. Sebi. Uma pena que esses só tem em inglês.

Pessoas que eu admiro, que mostram o veganismo acessível e que tem seus corres também com comida vegana:

@zecatofu
@pretaveg
@vegana.semgrana
@clubedopate
@bananabuffetvegano
@natumesa_
@caruruverde
@movimentoafrovegano

E os meus cantinhos preferidos são o Bistrô Trevo Vegetariano no Rio, Congolinária e Toya Vegan em São Paulo e Rango Vegan em Salvador.

Guilherme Petro

Jornalista, cozinheiro e professor de culinária, é co-autor do Prato Firmeza – Guia Gastronômico das Quebradas e cria conteúdos sobre alimentação consciente e acessível. Acompanhe mais no Instagram @guilhermespetro.