Vanessa Galvão, 26, começou vendendo tortas na faculdade e o negócio tomou forma. Hoje, o “De Torta em Porta” faz cerca de 40 entregas por mês, entre salgados e as famigeradas tortas, nos mais diversos sabores, a preços bem acessíveis. Entregando os pedidos nas catracas de metrô, O De Torta Em Porta fez parte da segunda edição do Prato Firmeza – guia gastronômico das quebradas de São Paulo.

Quando decidiu se tornar vegana? Como foi esse processo? 
Me tornar vegana não foi um processo repentino e isolado, começou em 2013 quando adotei um gato, o Pooky. Fui criada sem animais e não tinha apego, mas ele mudou a minha vida e, em 2014, me questionei sobre uma coisa simples: o fato de amar tanto aquela vida e consumir outras. Não fazia mais sentido pra mim e eu comecei a ter compaixão por todos os animais.

Me tornei ovolactovegetariana e, com o conhecimento que o vegetarianismo me trouxe, percebi que parar de consumir animais mas ainda comer derivados era como se eu não fizesse muita coisa por eles. De que adiantava não comer a galinha mas pagar pra ela ser mantida presa para botar ovos e, consequentemente, ser morta depois? Me tornei vegana no começo de 2017, parei de consumir derivados e marcas que testam ou patrocinam eventos que contenham animais e foi a melhor escolha que fiz.

Teve alguma dificuldade na transição? Qual foi a maior e como fez para passar por ela? 
Tive dificuldade no início por não saber cozinhar. Tive que aprender praticamente do zero e adorei tanto que hoje vivo disso. Aprendi muito em sites de receitas, grupos no Facebook e testando. Já fiz muita coisa ruim, claro, mas é um aprendizado diário. Comer na rua quando parei de comer carnes era fácil, mas quando parei de comer queijo e ovo ficou muito difícil. A questão social também. As pessoas até compreendem quando você para de comer carne, mas quando para de comer queijo parece até que as ofende, que é frescura, que é inútil e questionam muitas vezes sem querer compreender. De longe essa parte foi a mais difícil para mim.

Como começou o de Torta em Porta?
O De Torta Em Porta começou com vendas de tortas nas festas da faculdade. Aprendi com meu então namorado e atual marido a fazer torta de jaca e no natal de 2016 vendi pela primeira vez para amigos de uma amiga e comecei o negócio. Em seguida vieram os salgados que atualmente são o foco do meu trabalho, já que fazem parte de festas, comemorações e não são facilmente encontrados em todos os lugares. Como morava em SP, entregava, à princípio, nas casas dos clientes, por isso o nome. Hoje costumo falar que é “de torta em catraca”, já que agora entrego apenas nas estações do metrô (risos).

Foto: Larissa Bueno

Como foi a recepção inicial do público?
Fui muito bem recebida. Era uma época em que a jaca estava começando a ser divulgada como prato salgado. Muita gente ficou curiosa, inclusive pessoas que comiam carne. Ouvi de várias pessoas que a coxinha de jaca é melhor que a de frango e tive ajuda de amigos para divulgar o que estava fazendo. Isso foi essencial também.

Quais produtos são vendidos?
Tortas: Abóbora com jaca; abóbora com couve e espinafre; abobrinha com alho poró, couve e queijo de batata; berinjela com tomate; brócolis, alho poró e queijo de batata; jaca e soja com legumes.

Salgados: Bolinha de queijo de batata; coxinhas nos sabores jaca, brócolis e berinjela; croquete de soja; quibe de lentilha; risoles nos sabores palmito e abobrinha.

Você mora no interior, certo? Em que cidade? Como é a logística de produção, transporte e entregas na capital?
Atualmente moro em Itatiba. Sempre que possível vou ao centro de São Paulo e compro parte dos ingredientes na Zona Cerealista e as embalagens na rua Cantareira. Vegetais compro semanalmente em Itatiba mesmo, nos dias de oferta nos supermercados. Não há feira fácil para ir. As entregas são feitas de transporte público. Se eu fosse para São Paulo de ônibus de viagem sairia muito caro, não compensaria pra mim e não gostaria de repassar esse valor. Então, vou de ônibus até a divisa com Jundiaí e lá pego outro ônibus até a estação Jundiaí da CPTM, de onde sigo até a Luz.

Ao todo, são três horas pra chegar em São Paulo, um percurso que levaria 40 minutos de carro, mas não tenho essa opção no momento. As entregas são feitas geralmente em um dia por semana, com horários previamente marcados e local de encontro definido. Quando posso, volto no mesmo dia, mas se fica muito tarde fico em São Paulo na casa da minha sogra. Quando entrego salgados fritos para festas vou pra São Paulo antes e frito por lá também, já que levar de Itatiba para São Paulo seria inviável.

Você sempre cozinhou? Como é o processo de criação das receitas?
Comecei a cozinhar quando me tornei vegetariana, antes disso só sabia fazer arroz e macarrão. Com exceção da receita da jaca, que me ensinaram, as receitas foram criadas a partir de buscas em sites, testes e adaptações. Sempre busco fazer receitas com ingredientes simples e tradicionais para que elas atinjam não só o público vegetariano, mas principalmente os onívoros. Quero mostrar que comida vegana é comida normal.

Foto: Larissa Bueno

Você tem outras atuações além da empresa? 
Sou estudante de Ciências Biológicas e faço mestrado na área de Biomateriais.

Quais os planos para o futuro?
Com o mestrado sendo em período integral terei que ajustar as entregas e talvez reduzir a produção em algum momento. Ainda não sei exatamente como será, mas tenho um público muito legal e não quero perder essa interação. Vou conciliar ao máximo para que nenhuma área seja prejudicada. Quero incluir também novas opções, porém devido a minha restrição com entregas pelo peso, já que dependo do transporte público, ainda não tenho previsão de novidades.

Quais dicas daria para quem está começando a conhecer o veganismo? 
Conversar com pessoas que passaram pelo mesmo processo é muito bom. Caso não conheça ninguém, entre em grupos nas redes sociais. Há muitos veganos pelo Brasil, e também há muitas pessoas com as mesmas dúvidas. Assista a documentários, vídeos, crie receitas com o que você tem em casa e, principalmente, lembre-se sempre do motivo que te faz querer o vegetarianismo e tenha em mente que você fará muita diferença se tornando mais um.

O que indicaria para os seguidores da Animal Equality no que se trata de bibliografia sobre veganismo e alimentação, além de lugares para consumir?
Muita gente pensa que veganismo é coisa de rico, que a alimentação é feita com produtos caríssimos e de difícil obtenção, mas não é assim. Veganismo é comida da feira, comida barata e para todos. Por isso, eu sempre indico um grupo no Facebook chamado Veganos Pobres Brasil. É um grupo de receitas com milhares de pessoas compartilhando seus pratos simples e incríveis. No âmbito nutricional, recomendo artigos, livros e vídeos do médico e nutrólogo Eric Slywitch, referência nacional e muito didático na alimentação vegetariana.

Em São Paulo há muitas opções legais, o meu favorito é o Pop Vegan Food, restaurante e pizzaria com proposta encantadora. Recomendo também os pequenos produtores. No Facebook há um grupo chamado Compro de quem faz vegan, que tem desde cosméticos a comidas elaboradas. Além desses, o perfil RotaVEG, no Instagram, dá dicas de locais muito bons.

Vanessa Galvão – De Torta Em Porta
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Guilherme Petro

Jornalista, cozinheiro e professor de culinária, é co-autor do Prato Firmeza – Guia Gastronômico das Quebradas e cria conteúdos sobre alimentação consciente e acessível. Acompanhe mais no Instagram @guilhermespetro.