Após uma década de pesquisas e inserção no mercado internacional, produtos substitutos, como as “carnes de plantas”, finalmente chegam ao Brasil,

Um dos primeiros pratos adaptados por quem adota uma alimentação baseada em plantas, tanto pela facilidade quanto pelo costume que criamos de comê-lo ao longo da vida, é o hambúrguer. As receitas são inúmeras e cada um vai criando uma versão própria, utilizando como base alimentos de diferentes grupos, como batatas, ervilhas, feijões, grão-de-bico ou cogumelos. No entanto, imitações criadas pela indústria, com gosto, textura e aparência idênticas à da carne, já são uma realidade que tem se espalhado pelo mundo e que chega com força no Brasil em 2019.

Primeiro produto da startup Fazenda Futuro, o Futuro Burguer chegou ao mercado em maio, começando pelo Rio de Janeiro, onde está sendo comercializado no T.T. Burguer, e em em São Paulo, nas redes da Lanchonete da Cidade e nos supermercados St. Marché, Pão de Açúcar e Eataly. O preço estimado é de R$16,99 pelo pacote com duas unidades do hambúrguer, feito à base de ervilha, proteína isolada de soja e de grão-de-bico. Com o slogan “É free-boi!”, o mercado-alvo não é apenas o vegetariano/vegano. A empresa, que se classifica como “a primeira foodtech brasileira”, foi criada em 2017 pelos sócios Alfredo Strechinsky e Marcos Leta, fundador da empresa de sucos Do Bem, e quer competir diretamente com a indústria da carne.

A Superbom, marca mais conhecida por lançar suas versões de proteína vegetal, também lançou seu hambúrguer neste mês, batizado de Burger Gourmet Vegan. Outra empresa, que também se classifica como a primeira a criar a “carne plant-based”, é a Behind The Foods. Sem revelar grandes detalhes, a empresa do publicitário Leandro Mendes pretende lançar os primeiros hambúrgueres em junho, apenas para estabelecimentos por enquanto, para depois ser comercializada diretamente para o público final.

Apesar do caráter pioneiro promovido pelo marketing das marcas, a emulação da carne não é novidade aqui no Brasil, tanto que já temos até “açougue vegano” funcionando. O No Bones — Vegan Butcher Shop, que hoje conta com lojas em Niterói, no Rio de Janeiro, Taubaté e São José dos Campos, em São Paulo, teve sua matriz inaugurada no final de 2016 na capital paulista, com a proposta de vender “cortes” com formatos semelhantes aos de açougues tradicionais, como a costelinha feita com cogumelos eryngui e barbecue ou o “caveman meat”, com um formato que faz alusão aos tempos das cavernas e é feito com um mix de feijões. A picanha vegetal, de arroz vermelho e beterraba e queijo de batata para simular a gordurinha, também chama a atenção pelo formato que lembra os cortes de churrascaria e até cortes considerados mais “sofisticados” como o carré ganham uma nova versão. Lá, é feito com quinoa preta e shimeji, além do osso de batata doce.

Pioneira no mundo, a Beyond Meat é uma empresa americana fundada em 2009 e que lançou, em 2016, o primeiro hambúrguer à base de proteína vegetal a ser vendido junto com as versões de carne, tamanha a semelhança, que a colocou como concorrente direta no mercado. É curioso porém que a Tyson Foods, segunda maior empresa de carnes do mundo e a maior dos EUA, foi investidora da empresa entre 2016 e abril de 2019. De lá para cá, a empresa já lançou diversos outros produtos que semelhantes à carne, como salsichas e carne moída, utilizando como base a proteína de ervilha, sem usar qualquer tipo de produto de origem animal. Recentemente, a empresa estreou na bolsa de valores americana e foi avaliada em 3,8 bilhões de dólares.

No mesmo ano de lançamento do Beyond Burguer, surgiu também o Impossible Burguer, produto principal da Impossible Foods, empresa americana fundada em 2011. O hambúrguer tem como principal composto o heme, que é um líquido feito a partir da fermentação de proteínas de soja, e passou a ser comercializado em maior escala em restaurantes de chefs renomados, como o Momofuku Nishi, localizado em Nova York e comandado pelo estrelado chef David Chang. Em abril, a rede de lanchonetes fast-food Burguer King anunciou o Impossible Whopper como um piloto nas unidades da cidade de St. Louis e planeja que até o final de 2019 o hambúrguer esteja disponível em todo o território americano.

Na Austrália, a rede de lanchonetes Grill’d adotou o Beyond Burguer e, aderindo à campanha Segunda Sem Carne, serve apenas hambúrgueres à base de vegetais em suas 137 unidades espalhadas pelo país neste dia. Segundo o fundador da rede, Simon Crowe, as vendas dos lanches livres de carne mais que dobrou em 2018, e essa mudança é perceptível especialmente em clientes que costumavam comer carne e hoje começam a considerar outras opções.

Moving Mountains Foods é outra startup que segue a mesma linha de negócio e produtos. Fundada na Inglaterra, também desenvolveu seu próprio hambúrguer, apelidado de B12 Burguer, por conter, em cada unidade, 100% da quantidade recomendada da vitamina diariamente. Com ingredientes como cogumelo, proteínas de soja, ervilha e trigo e óleo de coco, o produto chega a “sangrar” suco de beterraba. Comercializando apenas no país, a empresa pretende lançar em maio sua própria versão idêntica do cachorro-quente, com uma salsicha à base de sementes de girassol, além de cenoura, cebola e óleo de coco, entre outros ingredientes vegetais.

E não é só na imitação de carne que a indústria tem investido. Também fundada em 2011, a Just Inc., empresa americana de alimentos antigamente conhecida por Hampton Creek Foods, Inc., é responsável pela criação de versões vegetais de maionese e até ovos. A versão, é feita à base de brotos de feijão e vem engarrafada, num líquido que, quando aquecido, adquire uma textura semelhante à dos ovos mexidos. A Clara Foods, por sua vez, é voltada para a agricultura celular e estuda como reproduzir a clara do ovo com todas as suas caraterísticas sem utilizar nenhuma galinha.

Podemos dizer, portanto, que a tendência “plant-based”, ou alimentação à base de plantas, nasceu e tem crescido ao longo da década, já atingindo gigantes da indústria, como a Unilever Nestlé, e que essa guinada da indústria na busca por alternativas aos produtos de origem animal coloca em discussão comportamentos específicos atrelados ao consumo de carne, bem como todo o simbolismo cultural e social que isso envolve e vem sendo construído ao longo da história da humanidade, e, principalmente, pode representar um grande passo rumo a um mundo com mais compaixão pelos animais.

Ainda assim, é importante lembrar que também se tratam de alimentos ultraprocessados, que não são essenciais para uma alimentação à base de plantas. A boa e velha comida caseira de cada dia continua sendo a base de uma alimentação balanceada, e, pensando nisso, a Animal Equality separou três receitas fáceis que podem funcionar como ótimas alternativas:

Hambúrguer de feijão preto (Por Paula Lumi, do Presunto Vegetariano)

Ingredientes:

1 xícara (de chá) de feijão preto cru
1/3 de xícara (de chá) de cebola bem picada
2 dentes alho médios bem picados
1 colher (de sopa) de orégano desidratado
2 colheres (de sopa) de azeite
1/2 xícara (de chá) de salsinha picada
1 colher (de sopa) de suco de limão
Sal a gosto
Pimenta moída a gosto
1/3 de xícara (de chá) de aveia em flocos finos
1/3 de xícara (de chá) de farinha de trigo integral ou branca

Modo de preparo:

1. Coloque o feijão preto cru em uma vasilha, cubra com o triplo de água e deixe de molho por 12 horas.
2. Escorra, lave, coloque em uma panela de pressão e cubra com 2 dedos de água. Deixe cozinhar por cerca de 15 minutos depois que pegar pressão e desligue.
3. Escorra completamente o feijão cozido, coloque em uma vasilha e amasse com um garfo. Se quiser, pode deixar alguns grãos inteiros para dar mais textura ao hambúrguer.
4. Adicione a cebola, o alho, o orégano, o suco de limão, o azeite, a salsinha picada, tempere com sal e pimenta a gosto e misture.
5. Adicione a aveia em flocos finos e a farinha de trigo e misture. Se necessário, adicione mais farinha, até a massa ficar modelável.
6. Modele hambúrgueres e frite em uma frigideira antiaderente com um fio de óleo, em fogo médio, até os dois lados ficarem bem douradinhos.

Hambúrguer de beterraba e grão de bico (por Tá Na Mesa)

Ingredientes:

2 colheres (sopa) de azeite de oliva

2 colheres (sopa) cebola picada

2 dentes de alho picado

2 beterrabas — cruas e raladas

1 abobrinha italiana ralada

2 xícaras de grão de bico cozido com sal

3 colheres (sopa) de farinha de arroz

3 colheres (sopa) farinha de mandioca

Sal de ervas ou comum

Tomilho, pimenta preta, chimichurri a gosto

Modo de preparo:

  1. Refogue o alho e cabelo em uma frigideira com azeite.
  2. Acrescente a beterraba, a abobrinha, sal pimenta-do-reino e chimichurri e refogue por aproximadamente 4 minutos.
  3. Em um processador, bata o refogado de beterraba com o grão de bico cozido.
  4. Passe a mistura para uma tigela acrescente a farinha de arroz, misture e em seguida coloque a farinha de mandioca.
  5. Modele, passe na farinha de mandioca e frite em uma frigideira com fio de azeite por aproximadamente 3 minutos de cada lado.

Tofu mexido com cúrcuma (por Bela Gil)

Ingredientes:

1 tofu (250 gramas) firme

1 colher (sopa) de azeite

3 dentes de alho

½ cebola

1–2 colheres de chá de curcuma (tempero conhecido também como açafrão-da-terra)

1 pitada de cominho

1 pitada de orégano

Gotinhas de limão

Sal marinho à gosto

Modo de preparo:

  1. Pressione o tofu com uma toalha limpa para absorver o excesso de água.
  2. Corte a cebola em pequenos pedaços.
  3. Aqueça o azeite em uma frigideira média em fogo médio.
  4. Adicione a cebola e o alho e refogue por dois minutos.
  5. Acrescente o resto dos temperos e refogue mais alguns segundos.
  6. Amasse o tofu com um garfo e adicione à frigideira.
  7. Mexa bem.
  8. Ajuste o sal e finalize com gotas de limão.

Guilherme Petro

Formado em Gastronomia pelo Mackenzie, já passou por diversas áreas dentro e fora dos restaurantes. Foi cozinheiro, garçom e fez gestão até de cozinhas universitárias. É gastrólogo, sommelier, bartender, assessor e fotógrafo de restaurantes, além de técnico em informática e de fazer ponto cruz, entre muitas coisas mais. Ele foi um dos jovens formado em Jornalismo pelo projeto Énois, e é co-autor e hoje coordenador do Prato Firmeza — Guia Gastronômico das Quebradas.